Listeria monocytogenes é um dos patogénicos alimentares mais temidos na Europa, não tanto pelo número de casos, mas pela gravidade da infeção que provoca – a listeriose. Esta doença rara, mas grave, afeta sobretudo idosos, grávidas e indivíduos imunocomprometidos, com taxas de hospitalização e mortalidade muito elevadas. Cerca de 99% dos casos estão associados ao consumo de alimentos contaminados, em particular produtos prontos a comer com validade longa, mesmo refrigerados – uma vez que L. monocytogenes consegue multiplicar-se a 4 ºC.
Apesar dos investimentos no controlo deste agente por parte da indústria, das entidades oficiais, incluindo as reguladoras, e da comunidade científica, continuam a ocorrer surtos de grandes dimensões e recolhas do mercado de grandes quantidades de produtos contaminados, com elevado impacto na saúde pública, na economia e no ambiente. Portugal é atualmente o terceiro país da Europa com a taxa mais elevada de casos por 100 mil habitantes. Entre 2020 e 2023, os casos mais do que duplicaram no país, crescendo a um ritmo superior ao da média europeia.
Parte do problema reside na capacidade de algumas estirpes de L. monocytogenes se estabelecerem de forma persistente nos ambientes de processamento alimentar, resistindo a procedimentos de limpeza e desinfeção. Estas estirpes persistentes podem sobreviver durante meses ou até anos na mesma fábrica, colonizando nichos como drenos, equipamentos ou superfícies de difícil acesso, aumentando o risco de contaminação cruzada dos alimentos. Quando L. monocytogenes se torna um problema persistente ou é detetada nos produtos, é essencial identificar a(s) causa(s) para implementar medidas corretivas eficazes.
Compreender os fatores que conferem esta capacidade de persistência é fundamental para melhorar as estratégias de prevenção. É precisamente este o foco do projeto “GenoPheno4trait - Características genotípicas e fenotípicas que contribuem para a persistência de Listeria monocytogenes em ambiente de processamento alimentar”. Este projeto combina genómica, fenotipagem e abordagens inovadoras como a metabolómica para identificar as características que tornam certas estirpes mais difíceis de erradicar. Parte de uma coleção de mais de 1.000 isolados já sequenciados por WGS (whole genome sequencing), o que assegura uma base robusta para a classificação e comparação rigorosa de estirpes.
O conhecimento gerado permitirá uma abordagem mais dirigida à vigilância e ao controlo, reforçando a segurança dos alimentos ao longo da cadeia. Reduzir a persistência de L. monocytogenes significa não só aumentar a segurança alimentar, mas também diminuir o desperdício e consequentemente as perdas económicas.
Entre os principais resultados esperados deste projeto destaca-se o lançamento de um Guia de Boas Práticas dedicado à gestão eficaz de L. monocytogenes em ambientes de processamento alimentar. Este guia, especialmente desenvolvido para profissionais da indústria alimentar, será publicado no último trimestre deste ano e contará com um Webinar complementar, que aprofundará os principais conceitos e recomendações.
Ambos os recursos serão anunciados em breve.
Gonçalo Almeida1, Rui Magalhães2, Pedro Sousa2, Lúcia Noronha3, Ana Sousa3, Paula Teixeira*
2Universidade Católica Portuguesa, CBQF - Centro de Biotecnologia e Química Fina – Laboratório Associado, Escola Superior de Biotecnologia, Rua Diogo Botelho 1327, 4169-005 Porto, Portugal
3Colab4Food - Laboratório Colaborativo para a Inovação da Indústria Agroalimentar, Rua dos Lagidos, 4485-655, Vairão, Vila do Conde, Portugal
2pcteixeira@ucp.pt
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