Reforço do bem-estar animal, redução do desperdício alimentar e contribuir para a descarbonização são alguns dos eixos que norteiam a indústria nacional da carne. Quem o diz é Graça Mariano, diretora executiva da Associação Portuguesa dos Industriais de Carnes (APIC) nesta entrevista à iALIMENTAR. A responsável recorda que as empresas portuguesas "têm tido um enorme investimento nas novas tecnologias". Alerta ainda para a "falta crónica" de veterinários da DGAV no que aos abates nos matadouros diz respeito.
É um setor muito inovador que tem procurado responder às solicitações não só dos consumidores como as que surgem no âmbito do reforço do bem-estar animal, da produção com menos aditivos, da redução do desperdício alimentar e ainda do ambiente, com a adaptação à descarbonização. Têm sido feitos investimentos descomunais com todos estes desafios, bem como com a aplicação dos requisitos legais impostos na Europa que são dos mais exigentes do mundo.
A carne vermelha é há muito estabelecida como uma importante fonte dietética de proteínas e nutrientes essenciais, incluindo ferro, zinco e vitamina B12.
Alguns estudos recentes referem que o seu consumo pode aumentar o risco de doenças cardiovasculares doença (DCV) e cancro do cólon, o que levou a uma perceção negativa do papel da carne vermelha na saúde, contudo, não foi explicado em que doses eram consumidas, que outros fatores de risco os consumidores detinham bem como, não foi também evidenciada a forma como feita feita a comparação, isto é, analisaram um grupo e compararam com quem? Com o resto da população?
Na verdade, apesar destes estudos relatarem uma possível associação entre a carne vermelha e o risco de DCV e cancro do cólon, várias limitações metodológicas e inconsistências foram identificados, o que pode ter impacto na validade das suas conclusões. Isto é, não se conseguiu inferir, com um grau de certeza aceitável, que existia de facto uma associação.
Uma quantidade substancial de provas apoia o papel da carne vermelha magra como moderador positivo dos perfis lipídicos, com estudos recentes a identificá-la como fonte alimentar da cadeia longa anti-inflamatória e ácido linoleico conjugado (CLA). Em conclusão, o consumo moderado de carne vermelha magra como parte de uma dieta equilibrada é pouco provável que aumente o risco de DCV ou cancro do cólon, mas pode influenciar positivamente a ingestão de nutrientes e perfis de ácidos gordos, tendo assim um impacto positivo sobre a saúde a longo prazo.
Há uma tendência para diabolizar a carne, os ovos e os alimentos de origem animal, mas o fundamental é enfatizarmos que os hábitos alimentares devem ser adequados todos os dias, pois, se desadequados, condicionam a saúde.
Na verdade, acontece muitas vezes que, quem come carne, consome-a em excesso, e não consome o suficiente em hortícolas, come-se muito sal e muito açúcar. No seu conjunto, hábitos desadequados, os quais todos juntos têm impacto muito negativo na saúde. Não é um fator só. Todos estes fatores fazem uma baixa adesão ao padrão da alimentação mediterrânica.
Há que sublinhar a importância do consumo da carne em padrões omnívoros, pois, enquanto espécie humana e na cadeia trófica, bem como no nosso próprio processo digestivo, dependemos da ingestão de carne. Inclusivamente a ingestão de ferro, na sua forma mais bio disponível, naturalmente que os vegetarianos terão que fazer as suas compensações. Importa adequar o consumo de carne à quantidade indicada na roda dos alimentos, bem como ajustar os hábitos em termos de consumo de hortícolas.
A carne continua a ser considerada um alimento importante para ser incluído moderadamente na dieta humana e numa alimentação diversificada pelo seu elevado valor proteico, vitamínico e mineral.
As empresas portuguesas têm tido um enorme investimento nas novas tecnologias, para produzirem alimentos em novas embalagens, funcionais, mais sustentáveis. Têm investido nos novos alimentos, novas práticas e processamentos mais seguros, e novos equipamentos e tecnologia de ponta.
No Sistema de Informação do Plano de Aprovação e Controlo de Estabelecimentos (SIPACE) da DGAV - Direção Geral de Alimentação e Veterinária, existem 90 registos de matadouros de ungulados domésticos.
Quanto a consumo, o último registo disponibilizado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) acerca do consumo de carne em Portugal é de 2020. A saber:
O consumo anual per capita (kg/hab.):
No que diz respeito a exportação/trocas intracomunitárias de bens de animais vivos e produtos do reino animal, em 2021, foram exportados com local de destino a:
Em Portugal, segundo o Sistema de Informação do Plano de Aprovação e Controlo de Estabelecimentos, existem 90 registos de matadouros de ungulados domésticos e 32 registos de matadouros de aves e Lagomorfos.
O grande constrangimento é a dificuldade em conseguir exportar para países terceiros, pelo facto dos processos serem muito longos e trabalhosos, envolvendo autoridade competente (AC) tal como a DGAV, a qual não detém pessoal suficiente para tratar, de forma célere, dos dossiers sanitários requeridos pelas AC dos países de destino. Embora detenha pessoal técnico muito profissional, não conseguem dar resposta em tempo pela falta de pessoal face a tantos assuntos que gerem, lamentavelmente.
No caso dos matadouros, também é um enorme constrangimento a falta de veterinários da DGAV que permitam os abates nos horários e nos dias que as indústrias precisam. Trata-se não só de garantir médicos veterinários da DGAV em número suficiente para que os nossos associados possam realizar os abates nos horários que precisam, sem se sujeitarem à disponibilidade da DGAV, pois até pagam a taxa de inspeção sanitária (que pode ser de 35 000 €/mês) mas também o de garantir que a DGAV tenha suficientes técnicos superiores para se dedicarem à internacionalização, à discussão dos dossiers sanitários, não só para se abrirem novos mercados, como também para se manterem abertos os que já foram abertos no passado. Sobre esta matéria, realçamos a importância de se abrirem mercados asiáticos, que possam substituir a China, os quais não foram ainda concretizados, nomeadamente, Vietname, Filipinas, Singapura, entre outros. Importa sublinhar a panóplia de legislação e requisitos variados a cumprir pela autoridade competente portuguesa (DGAV) e pelos operadores exportadores, impostos pela autoridade competente dos países terceiros.
Importa aqui realçar que não é só a falta crónica de trabalhadores da DGAV, mas também a necessidade de prever a substituição dos trabalhadores que estão a atingir a idade da reforma e ainda os que, de uma forma muito frequente, estão a pedir mobilidade para outros organismos da administração pública.
Fazendo uma análise global à estrutura etária dos trabalhadores da DGAV, tendo por base o balanço social da DGAV, verifica-se que 608 dos 1050 trabalhadores em exercício de funções na DGAV, a 31 de dezembro de 2020, tinham 50 ou mais anos, ou seja, tinham idades compreendidas entre os 50 e os 70 anos, idade do trabalhador mais velho.
Também é referido neste balanço social que, a breve trecho, se aposentarão 269 trabalhadores, considerando o número de efetivos com idade igual ou superior a 60 anos. Sendo que, destes, 125 são técnicos superiores, o que ainda nos deixa mais preocupados.
Por outro lado, o custo excessivo e sempre a aumentar dos fatores de produção, incluindo a matéria-prima e todas as fontes de energia. Este custo de produção não se consegue refletir no custo do alimento ao consumidor, o que poderá, em alguns casos, e se nada acontecer, resultar em falências.
Quanto ao desafio, ele passa por continuar a aplicar boas práticas em termos de sustentabilidade, continuando a adaptar as indústrias aos novos modelos de sustentabilidade. No passado, o grande enfoque era na segurança dos alimentos, agora e par deste conceito, existe o da sustentabilidade, pelo que, é de facto, um enorme desafio.
Realçamos a importância de se abrirem mercados asiáticos, que possam substituir a China, os quais não foram ainda concretizados, nomeadamente, Vietname, Filipinas, Singapura, entre outros
A associação existe para defender os interesses dos seus associados, e tem tentado a todo o custo chegar a todos, contudo, não tem sido fácil. Gostaríamos que os associados percebessem a importância de estarem próximos da APIC, e o quanto a associação pode ajudar na sua atividade. Seria muito importante que os associados conhecessem bem todas as potencialidades da APIC, que existe para os servir. Por esta razão, o grande objetivo é de conseguir falar a uma só voz e combater a desinformação e a desconhecimento. Além disso, temos como objetivo em 2022, promover a devida comunicação, a qual consideramos ser fundamental.
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iAlimentar - Informação profissional para a indústria alimentar portuguesa