Informação profissional para a indústria alimentar portuguesa

A caminho de uma embalagem 100% sustentável?

Alexandra Costa14/03/2022

A embalagem de hoje é muito diferente da de há 10 anos. A sustentabilidade e o conhecimento científico trouxeram uma maior consciência, mas também uma maior exigência. Novos materiais, reutilização, reciclagem... são apenas alguns dos termos que estão, cada vez mais, intimamente associados às embalagens. Com uma novidade: a interligação à tecnologia.

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Reciclagem, reutilização de materiais, novos materiais. Estes são apenas alguns dos temas que, hoje, fazem parte da temática das embalagens. Mas nem sempre foi assim. Basta pensar nos últimos 10 anos. Bastou uma década para tudo (ou muito) mudar no mundo das embalagens. Como refere Susana Fonseca, da ZERO - Associação Sistema Terrestre Sustentável, verificaram-se várias evoluções “pois começaram a ser testados novos materiais de embalagem, tornaram-se mais claros alguns entraves que se colocam à reciclagem de muitos materiais de embalagem e como através do ecodesign se pode potenciar a reciclagem (por exemplo, removendo alguns aditivos, privilegiando determinadas cores ou determinados rótulos, etc.)”. A par disso, acrescenta a ambientalista, foi “também um período crítico de tomada de consciência para a insustentabilidade do atual modelo de descartabilidade, onde o plástico acaba por ser a face mais visível, mas para o qual todos os materiais acabam por contribuir”. Ao que Deolinda Silva, diretora executiva da PortugalFoods, acrescenta o aumento de soluções mais ecológicas (por exemplo, embalagens mais leves, com materiais reciclados) devido às preocupações ambientais, bem como ao desenvolvimento de novas tecnologias como, por exemplo, o smart packaging para melhorar a qualidade e segurança alimentar (por exemplo embalagens com indicadores de frescura), embalagens de atmosfera modificada, sistemas de remoção de etileno, embalagens que absorvem humidade, revestimentos comestíveis, entre outras.

Por outro lado, aponta Susana Fonseca, com um maior conhecimento científico veio uma maior preocupação por temas como a toxicidade dos materiais utilizados nas nossas embalagens, em particular as pensadas para estar em contacto com os alimentos (área onde a regulamentação europeia é datada e necessita urgentemente de uma atualização). Já Leonardo Mathias, presidente da Associação SDR Portugal, refere que a última década veio trazer ao mercado uma extensa oferta de embalagens que melhoraram o ato de consumir – embalagens mais oportunas, mais convenientes, mais adequadas às novas realidades de consumo de uma sociedade que se transformou consideravelmente nos seus hábitos e desenhadas para assegurar a segurança alimentar –, o futuro exige que a embalagem, além da comodidade para o ato de consumo, seja também, e cada vez mais, responsável face aos recursos que usa.

Quer isto dizer que a embalagem já evoluiu tudo o que tinha a evoluir? A resposta imediata da diretora executiva da PortugalFoods é de que não. Na verdade, “vamos continuar a assistir a um aumento da procura de soluções de embalagens mais sustentáveis e igualmente mais tecnológicas”, dando como exemplo a aplicabilidade da IoT, reabastecimento automático, embalagens com ação antimicrobiana, embalagens que favorecem o aumento do tempo de vida útil dos alimentos e que mantêm o teor nutricional, contribuindo para a redução do desperdício alimentar, embalagens responsáveis que são desenvolvidas numa abordagem holística que leva à redução de embalagens não recicláveis e à expansão de embalagens multiuso e recicláveis. Já Susana Fonseca considera que o futuro, ou a sustentabilidade, se preferirem, passará por uma redução na quantidade de embalagens utilizadas, pela transição para modelos de reutilização, para a utilização de materiais que possam ser facilmente reintegrados na economia, uma vez que os produtos cheguem ao fim da sua vida, e com um cuidado muito particular à colocação no mercado de embalagens que não possuam substâncias perigosas que possam colocar em risco a saúde humana, o ambiente ou a economia circular.

A ambientalista da Zero considera que é necessário estar particularmente atento à utilização de materiais reciclados em embalagens em contacto com alimentos e em relação a materiais (alguns novos, outros mais correntes) que necessitam de aditivos para que possam ter determinadas características (por exemplo serem resistentes à humidade). “A utilização de substâncias químicas persistentes – como os PFAS - em embalagens para alimentos apresentadas como 'biodegradáveis' é uma contradição nos termos e um enorme risco para a nossa saúde”, aponta. Um outro exemplo dado que Susana Fonseca considera ser claro é o do Bisfenol A, “um aditivo usado em algumas embalagens alimentares sobre o qual a EFSA acabou de propor que o limite exposição seja reduzido 100 000 vezes”. Face a isto, a técnica da Zero aconselha precaução por forma a “evitar que andemos décadas a ingerir substâncias químicas que podem prejudicar a nossa saúde, enquanto a indústria procura atrasar ao máximo a sua regulamentação”. Resumindo, para a Zero, o foco principal deve ser na redução e reutilização (que pode ter diferentes formatos e apresentações e pode ser feita pelo próprio ou de forma mais centralizada). Para uma reutilização eficaz, é fundamental trabalhar também na normalização das embalagens, isto é, existirem formatos padrão que são depois usados por diferentes marcas.

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O que dizem as tendências

Menos é mais. Esta pode ser, de uma forma muito simples, a principal tendência no que se refere à embalagem. Mas mais que isso. Reutilizável. Sempre reciclável. Com integração de material reciclado, mas após análise de potenciais riscos para a saúde humana e ambiente. Sem substâncias químicas perigosas. A tudo isto Susana Fonseca acrescenta ainda que os novos materiais devem ser muito bem escrutinados antes de serem autorizados. Na mesma linha, Deolinda Silva aponta que, em termos de tendência, a sustentabilidade assume-se como um dos principais pontos a dar resposta, pelo que será crescente a procura de matérias-primas renováveis ou recicladas obtidas de forma responsável, materiais recicláveis e neutros em carbono, embalagens biodegradáveis e compostáveis, utilização de cartão e papel com certificação FSC, que certifica que as florestas estão a ser geridas de forma responsável, garantia da eficiência energética na produção da embalagem, embalagens sem contacto e mais interativas e que permitem assegurar a transparência dos produtos. E acrescenta que, a par das preocupações com o carbono, também haverá maior responsabilidade no uso da água no fabrico da embalagem. Na associação com a tecnologia, nomeadamente à internet das Coisas (IoT), a convicção da diretora executiva da PortugalFoods é que as embalagens inteligentes permitirão mudar o paradigma relativamente à forma como os consumidores gerem e adquirem os seus bens de consumo.

Uma outra tendência prende-se com cada vez mais consumidores utilizarem os seus próprios recipientes quando vão às compras. Como conciliar isso com a sustentabilidade e reciclagem das embalagens? Sobre isto, Deolinda Silva lembra que a embalagem nos produtos alimentares tem funções fulcrais, como é o caso de conter os alimentos e protegê-los, facultar informação sobre o produto (por exemplo, informação nutricional e modo de utilização), conferir identidade a uma marca, fornecer conveniência e permitir apresentar os produtos de forma atraente aos consumidores. “Mas, acima de tudo, a sua função de garantia da segurança e qualidade dos alimentos é fundamental para se assegurar não só a segurança do consumidor como a redução do desperdício de alimentos”, afirma. No caso concreto de os consumidores usarem os seus próprios recipientes, a responsável da PortugalFoods considera que esta tendência tem por detrás razões relacionadas com a sustentabilidade e a poupança, como por exemplo a compra de produtos a granel (o arroz e as leguminosas são dois bons exemplos) e o acondicionamento de produtos de peixaria, talho, padaria, take-away e charcutaria. A isto há que acrescentar a taxação dos produtos de embalagem.

Já Susana Fonseca aponta que, se a reutilização tem um papel fulcral no nosso caminho para a sustentabilidade na área das embalagens, para que possamos fazer “esta transição temos de deixar os pequenos projetos e apostar em transformações estruturais em termos da infraestrutura de produção/enchimento, logística, higienização, na padronização de soluções de embalagem”. Para a ambientalista, se é verdade que os sistemas em que o próprio consumidor fica responsável pela higienização são os mais simples, é fundamental perceber que esta é uma mudança estrutural que, para ocorrer, necessita de intervenções a vários níveis. “Não basta ter uma solução. É preciso torná-la atrativa para quem a vai usar e sabemos que sair do modelo do descartável não é fácil. Assim, é necessária regulamentação e penalizações das piores soluções e incentivo às melhores”, contata a técnica da Zero.

Com base na evolução já feita e nas tendências previstas será possível, algures no futuro, ter uma embalagem 100% sustentável? Meio a brincar, Susana Fonseca responde que “do nosso ponto de vista, uma embalagem 100% sustentável é a que não tem de ser produzida”. Mas, acrescenta, a sustentabilidade não é preto e branco. A resposta passa, então, a ser: “Dependendo dos fatores a que dermos maior importância, poderemos chegar a diferentes conclusões sobre a sustentabilidade de uma embalagem”.

Menos é mais. Esta pode ser, de uma forma muito simples, a principal tendência no que se refere à embalagem. Mas mais que isso. Reutilizável. Sempre reciclável. Com integração de material reciclado, mas após análise de potenciais riscos para a saúde humana e ambiente. Sem substâncias químicas perigosas

A questão da reciclagem

É inevitável que o futuro da embalagem passe muito pela reciclagem da mesma. Sobre isso, Leonardo Mathias é perentório. “A embalagem e o design, o eco design, da embalagem são fundamentais para o sucesso dos sistemas de recolha, valorização e reciclagem como o sistema de devolução e reembolso proposto pela SDR Portugal para as embalagens de bebidas não reutilizáveis”, afirma, acrescentado que este é um modelo que permite, também, aumentar a qualidade da matéria-prima recolhida e, consequentemente, melhorar a qualidade do reciclado e posterior integração em novas embalagens, reduzindo a necessidade de integrar matéria-prima virgem e aumentando a circularidade dos materiais. E o certo é que a indústria e o retalho têm mostrado estar atentos e sensíveis para esta realidade. A prova é que cada vez mais embalagens incorporam matérias-primas mais sustentáveis. Estas, explica o presidente da Associação SDR Portugal, permitem a reutilização ou uma melhor valorização após o consumo, com formatos mais eficientes que permitem transportar “menos ar” no processo logístico, são vários os exemplos que a indústria tem e continua a apresentar. Por outro lado, acrescenta Leonardo Mathias, também o processo de rotulagem destas embalagens é uma oportunidade, não só ao nível dos formatos, mas também da sistematização da informação que disponibiliza ao consumidor e também à própria indústria.

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Inovação portuguesa

Nos últimos anos, têm surgido vários projetos interessantes no setor agroalimentar português. Questionada a este respeito Deolinda Silva remeteu, imediatamente, para a embalagem de arroz 100% papel da NOVARROZ, a garrafa de água biodegradável desenvolvida pela Monchique e a Universidade do Minho, as garrafas com plástico reciclado que foi recuperado do Mar Mediterrâneo e praias da Coca-Cola, a Carlsberg e a Poboco desenvolveram protótipos de uma garrafa de fibra de madeira de fontes sustentáveis, a Fiskeriet tem na sua embalagem de salmão um indicador de frescura do produto, o que permite informar o consumidor a respeito do prazo de validade do produto e a DS Smith desenvolveu a ECOVETE que é uma linha de embalagens 100% reciclável destinada ao setor hortofrutícola, conferindo proteção, sistema anti-humidade e antiderrapante, bem como o correto acondicionamento dos alimentos.

Projetos de investigação a decorrer em Portugal, no âmbito da inovação na embalagem:

  • Projeto Recyfilm - tem como principal objetivo a reciclagem de resíduos de filmes multicamada (PE/PA/EVOH) utilizado em embalagens de produtos alimentares, transformando um material de pouco valor comercial num novo filme monocamada com mais alto valor através do desenvolvimento de formulações que possam permitir processos de transformação industrial.
  • Projeto CLEVER - Desenvolvimento de garrafas de vidro branco e transparente capazes de preservar a qualidade da cerveja.
  • Projeto SMASUS: Smart and Sustainable Packaging - visa o desenvolvimento de embalagens plásticas inteligentes, funcionais e sustentáveis para medicamentos e suplementos alimentares, recorrendo a soluções de revestimentos ativos e funcionais e sensorização, para manutenção/conservação da sua shelf-life e monitorização do estado do produto embalado.
  • Projeto BioProtect: Desenvolvimento de material de embalagem biodegradável com propriedades ativas para conservação de alimentos.

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