O projeto Pão de Medronho é uma ideia inovadora com cerca de 12 anos, e que nos últimos oito tomou a forma de um trabalho de investigação e de investimento.
Conjugados estes factos com o espírito criativo e as competências de gestão adquiridas numa primeira licenciatura em Gestão Turística e Hoteleira no Politécnico de Leiria, começou a surgir a intenção e vontade de criar um modelo de negócio com o Pão Medronho®. Registou-se a marca, pensou-se num modelo de exploração e fez-se um plano de negócios. Não obstante, havia muitos constrangimentos tecnológicos a superar para podermos escalar a comercialização do produto quando quiséssemos ir para o mercado. Em 2014, decido voltar a estudar e a fazer uma nova licenciatura em Dietética e Nutrição, também no Politécnico de Leiria e, nessa altura, inicio trabalhos de investigação com o fruto.
Incentivado por alguns docentes a investigar o medronho na perspetiva da tecnologia alimentar e das vantagens nutricionais do fruto, lancei mãos a um investimento de vários anos de trabalho laboratorial e em empresas, a fim de desenvolver a tecnologia necessária para depois chegarmos à fórmula de Pão Medronho® que se encontra no mercado.
Ao iniciar todo este trabalho, sabia que os medronhos são uma matéria-prima difícil de trabalhar não só tecnologicamente, mas também na sua aquisição, uma vez que a maioria dos produtores têm as suas explorações orientadas para a destilação de aguardente. Por outro lado, ainda é, infelizmente, um produto pouco valorizado enquanto fruto para consumo em fresco, por isso, pouco conhecido pela população. Não existia, e continua por criar uma fileira organizada, que nos permita incrementar, sem receios, o desenvolvimento de produtos que incorporem matérias-primas derivadas de medronho.
“Não existia, e continua por criar uma fileira organizada, que nos permita incrementar sem receios, o desenvolvimento de produtos que incorporem matérias-primas derivadas de medronho”
Se o desafio inicial era resolver constrangimentos associados à fórmula de pão, rapidamente os objetivos de I&D com medronhos se posicionaram em linha com a sustentabilidade da cadeia de valor do fruto, no desenvolvimento de soluções de aplicação do fruto em diferentes matrizes alimentares, na valorização nutricional e na preservação dos compostos bioativos do fruto e, na fase final do processo, o desenvolvimento de novos alimentos com medronhos.
Sem financiamento externo, mas com grande vontade de levar o projeto a bom porto, tomo a decisão de investir os meus recursos financeiros, o tempo, o trabalho de investigação e as competências que ia adquirindo durante a licenciatura em Nutrição e no mestrado em Gestão da Qualidade e Segurança Alimentar. Tive sempre o apoio do Politécnico de Leiria, tal como de alguns docentes da Escola Superior de Saúde de Leiria, mais recentemente da Escola Superior de Turismo e Mar de Peniche e do CETEMARES. Destaco nesta caminhada as professoras Susana Cardoso, Vânia Ribeiro, Cidália Pereira, Susana Silva e Ana Augusto.
Durante os últimos oito anos realizaram-se dezenas de fórmulas, testes, ensaios e provas de conceito, testes e provas de consumo com painéis informais e treinados. Neste processo, fomos conhecendo melhor a matéria-prima que estávamos a utilizar, os problemas e desafios que se nos deparavam. Simultaneamente, fomos desenvolvendo as soluções para que pudéssemos trabalhar em escala. Nem sempre foi um percurso em crescente ânimo. Em alguns momentos pensei mesmo em desistir, continuando a produzir e consumir apenas em contexto familiar o pão de medronho, o que já acontece há 10 anos. No entanto, como não sou de desistir facilmente, em 2017, tomo a decisão de empreender todos os esforços necessários para sair do laboratório e trabalhar o produto na escala da indústria de panificação. Procurei um parceiro, que dominasse os conhecimentos da panificação. Encontrei a Ritus do Pão, uma padaria familiar, mas de dimensão significativa em Monte Redondo, Leiria. É nesta altura, com auxílio do Nuno Gonçalves, proprietário da empresa, que passamos à fase de testes em escala semi-industrial. Nesta etapa, que durou cerca de dois anos, novos constrangimentos se depararam, mas também novas soluções se encontraram. Mantendo a matriz inicial foram feitos os ajustes necessários para podermos arrancar com a produção e comercialização.
Com estes estudos, conseguiu-se obter uma fórmula de pão que apresenta atividade antioxidante de cerca de 19%, contém 20% dos VDR (Valor diário recomendado) de ingestão de fibra dietética por 100 g de pão, uma longevidade até 6 dias. Para além disso, contém todos os minerais e oligoelementos do fruto e algumas vitaminas do complexo C, E, cuja fonte é o medronho biológico que utilizamos. Tem duas alegações nutricionais: fonte de proteína, fonte de fibra.
A fórmula já disponível no mercado desde 2020, é um produto clean label, a farinha de trigo utilizada no processo não contém qualquer correção ou enriquecimento, o fruto utilizado é biológico e não é utilizado qualquer auxiliar ou aditivo de síntese na fórmula. Este pão enquadra-se na categoria Novel Food, de acordo com o Regulamento (CE) nº 258/97, artº 1º, alínea f), para alimentos obtidos por processos não correntes, e caso esses processos conduzam a alterações nutricionais decorrentes da estrutura do alimento ou ingredientes incorporados.
Este projeto permitiu ainda a criação de uma empresa, a Medronho & Canela – Inovação Alimentar e Nutricional, LDA, Spinn-off do Politécnico de Leiria, com sede em Proença-a-Nova, que se dedica à exploração da marca registada – Pão Medronho, e tem a decorrer seis linhas de I&D para novas aplicações de medronho. A empresa executou nos últimos oito anos, cerca de duzentos mil euros de investimento nestas operações. A parceria é com a SONAE MC, e estará à venda nas lojas Continente.
O Pão Medronho® está à venda em Leiria em alguns supermercados da rede Coviran/Ritus do Pão e, nas próximas semanas, terá a sua primeira expansão para o mercado nacional, numa parceria com uma cadeia de distribuição de retalho. As perspetivas são de chegar a uma cobertura de cerca de 50% do território nacional numa primeira fase, e, posteriormente, cobrir o território nacional em mais de 300 lojas da marca.
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