Talleres Filsa, S.A.U.
Informação profissional para a indústria alimentar portuguesa
“A indústria saberá adaptar-se aos novos tempos”

Entrevista com Pedro Queiroz, Diretor-geral da FIPA

Emília Freire14/06/2021

A pandemia de Covid-19 teve um forte impacto na indústria alimentar, o maior setor industrial em Portugal, por via, principalmente, do fecho do canal HoReCa, mas o diretor-geral da Federação das Indústrias Portuguesas Agroalimentares (FIPA) assegura: “A indústria saberá adaptar-se aos novos tempos, empreender as mudanças necessárias, inovando e trazendo novas experiências aos consumidores, para dar a volta a esta situação”.

"A indústria fez um trabalho fantástico porque continuámos sempre a ter alimentos nas prateleiras… como nós dissemos...

"A indústria fez um trabalho fantástico porque continuámos sempre a ter alimentos nas prateleiras… como nós dissemos: ‘a indústria alimentar não pode parar’, e nunca parou. Vai ficar para a história desta pandemia".

Quais são os pontos principais da evolução do setor alimentar em Portugal nos últimos anos?

Estamos a falar do maior setor industrial em Portugal que, até 2020, vinha a crescer a um ritmo de cerca de 2% ao ano. Mas mais do que essa vertente económica, é uma indústria que tem tido uma evolução grande ao nível dos desafios societais: tem dado respostas ao nível da inovação, da sustentabilidade, da informação ao consumidor e da modernização tecnológica. É, assim, uma indústria que tem vindo a crescer ao longo dos anos mas, acima de tudo, tem sabido modernizar-se e dar respostas às demandas da sociedade.

Na FIPA temos tentado alavancar estes eixos, dar visibilidade a este trabalho conjunto que a indústria tem feito e procurado, sempre que necessário, desbloquear um conjunto de barreiras que vão surgindo, políticas e legais, por exemplo, para que a indústria possa fazer o seu trabalho e explorar todo o seu potencial.

De que forma a pandemia tem afetado o setor?

Tem sofrido como os outros setores e é enganadora aquela ideia que se tenta fazer passar: ‘as pessoas continuaram a comer, por isso o setor está bem’, não é verdade. Não nos podemos esquecer que além de muitas empresas com cantinas, que estiveram encerradas, o canal HoReCa fechou… somando o confinamento de 2020 e o de 2021 já são muitos meses fechado e a indústria, como fornecedora, foi bastante impactada. Ainda não temos números oficiais do INE [16 de março] mas temos a noção que o ano de 2020 foi negativo para vários setores e prevemos que tenha havido um recuo de faturação no setor de forma geral, o que é pena porque, apesar de não crescer muito anualmente, era uma indústria que vinha a ganhar uma boa dinâmica.

Mas estou absolutamente crente que a indústria saberá adaptar-se aos novos tempos, empreender as mudanças necessárias, inovando e trazendo novas experiências aos consumidores, para dar a volta a esta situação.

E foi uma indústria que, precisamente por causa da Covid, ainda teve de fazer mais investimentos em segurança e proteção…

Sim, embora esta indústria já por si, não dispensa um conjunto de equipamentos de proteção individual, pela segurança dos alimentos, mas é verdade que teve de investir ainda mais nesses equipamentos e em mais dispositivos para garantir, acima de tudo, a segurança dos seus trabalhadores, porque tinha uma missão fundamental neste período que era continuar a laborar. E fez um trabalho fantástico porque continuámos sempre a ter alimentos nas prateleiras… foi um trabalho magnífico e, realmente como nós dissemos: ‘a indústria alimentar não pode parar’, e nunca parou. Vai ficar para a história desta pandemia.

Esta indústria busca diariamente mais qualidade, segurança, valor nutricional, sustentabilidade da sua produção, e ao mesmo tempo coloca no mercado uma gama de produtos cada vez mais diversificada e com bastante valor acrescentado.

Com o fecho de fronteiras falou-se bastante na questão da autossuficiência nacional em relação a alguns bens alimentares, como os cereais, a carne, etc. Esta é uma questão importante para a indústria?

Vivemos num mercado aberto e acreditamos no Mercado Único, mas o setor aposta em produzir em Portugal tudo o que é possível. Gostaríamos que, do ponto de vista de valor, possamos ter um saldo positivo, ainda estamos longe, mas acreditamos que é possível, sendo um ator importante nas exportações, e mesmo com a pandemia elas cresceram um pouco – 2,5%.

Mas acreditamos que podemos incrementar as parcerias com a agricultura nacional. O setor agrícola está-se a modernizar e é muito desejável se pudermos criar cadeias nacionais de abastecimento, numa parceria entre a indústria e a agricultura para aumentar a produção de algumas matérias-primas necessárias para a nossa indústria e fazer crescer a cadeia de valor. Tem de ser um trabalho conjunto, cada vez mais assente na tecnologia e cremos que, se trabalharmos bem, pode vir a dar frutos.

Há recentes bons exemplos nesse sentido, como é o caso dos Cereais do Alentejo – onde se juntou produção, transformação e distribuição – que podem ser seguidos noutras categorias. Não acha?

Certamente este tipo de parcerias, que podem igualmente ter a participação de universidades, institutos politécnicos, etc., juntando também a ciência, poderão pôr a agricultura a desenvolver e melhorar espécies e incrementar culturas que depois sejam escoadas pela nossa indústria e isso é fundamental que aconteça.

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Acreditamos que podemos incrementar as parcerias com a agricultura nacional. O setor agrícola está-se a modernizar e é muito desejável se pudermos criar cadeias nacionais de abastecimento, numa parceria entre a indústria e a agricultura

"Esperamos que 2022 possa ser um ano já de algum crescimento"

Sabemos que este ano vai ser muito difícil… mas quais são as perspetivas da FIPA para o setor no pós-Covid?

O próximo ano ainda vai ser também muito difícil porque acreditamos que possa haver o retomar de algum consumo ainda este ano, principalmente se a reabertura da restauração for sustentada e não houver um passo atrás e fechar tudo novamente, porque isso se começa a tornar incomportável… mas vai ser um percurso difícil de recuperação. Mas acredito que a nossa indústria vai continuar a desenvolver todos os esforços para seguir este caminho de garantir a disponibilidade de alimentos e as necessidades dos consumidores, continuando o cumprimento dos seus compromissos ao nível da inovação e da sustentabilidade.

Esperamos que 2022 possa ser um ano já de algum crescimento mas… o mas está sempre presente, tendo em conta a imprevisibilidade atual.

A sustentabilidade é uma questão que está na ordem do dia, em que o setor tem vindo a trabalhar há muito, mas sabe-se pouco sobre o que se tem feito, não é?

Já há bastante tempo que esta indústria aposta nas questões da sustentabilidade, mas penso que, o facto de sermos um setor muito atomizado e disperso, não ajuda à boa comunicação dessas iniciativas. A FIPA tem procurado, em todas as suas intervenções, valorizar este trabalho em termos de sustentabilidade (nas três vertentes: económica, social e ambiental), porque é uma indústria que se tem empenhado nesta área, ao nível da produção, da qualidade do emprego, do reinvestimento social nas comunidades onde está inserida, de reduzir o impacto ambiental: inovação ao nível das embalagens, da modernização das fábricas e na otimização dos recursos.

É um setor também muito amplo e diverso, o que também não deve facilitar a comunicação…

Sem dúvida, a diversidade dos alimentos é grande e da indústria que os produz também. E vivemos numa época em que esta indústria busca diariamente mais qualidade, segurança, valor nutricional, sustentabilidade da sua produção, e ao mesmo tempo coloca no mercado uma gama de produtos cada vez mais diversificada e com bastante valor acrescentado.

Quais são as áreas em que a indústria alimentar está a apostar mais em termos de sustentabilidade?

Para além da vertente de inovação ao nível das embalagens, que já referi, a indústria tem trabalhado na redução da pegada ambiental – que penso que é uma matéria que vai entrar na discussão do dia-a-dia de uma forma mais aprofundada –, ao nível dos consumos de energia e de água, e da otimização da produção, dos transportes e da logística, contribuindo assim para o objetivo nacional de neutralidade carbónica.

Estes grandes desafios da sociedade, como a sustentabilidade e a economia circular, geram muita pressão sobre as empresas, mas é preciso entender que o trabalho que está por detrás não pode ser feito de um dia para o outro.

E que iniciativas o setor tem feito no caminho da economia circular?

A indústria tem procurado continuamente novas soluções para aproveitamento e valorização dos seus resíduos alimentares seja, por exemplo, como subprodutos para reincorporar na alimentação animal seja para outras áreas de negócio. A tudo o que é utilizado nesta indústria se procura dar a melhor utilização possível e isso exige também um grande trabalho de investigação, porque 'o manter no circuito’ é fácil de dizer mas, muitas vezes, não é fácil de fazer. O desenvolvimento da economia circular assenta muito na investigação&inovação e acreditamos que, em parceria com as universidades e politécnicos, e com apoios alguns europeus o setor irá prosseguir esta missão.

Estes grandes desafios da sociedade, como a sustentabilidade e a economia circular, geram muita pressão sobre as empresas, mas é preciso entender que o trabalho que está por detrás não pode ser feito de um dia para o outro.

"Indústria tem sido proativa na adaptação dos alimentos às demandas da sociedade"

Todos os estudos de tendências de consumo mostram que a pandemia acelerou as prioridades dos consumidores no sentido de uma alimentação mais saudável. A indústria está a conseguir dar resposta a esta mudança tão rápida?

Esse é um trabalho já de há muitos anos. A indústria tem sido muito proativa na adaptação dos alimentos às demandas da sociedade. Sabemos que apesar de haver uma variedade enorme de alimentos com composições nutricionais diversificadas, vivemos numa sociedade onde há um consumo excessivo de açúcar, sal e gorduras e que isso tem impacto na saúde pública. A indústria assumiu o compromisso de continuar a disponibilizar produtos de qualidade – e a qualidade envolve segurança, sabor e experiências –, mantendo essas caraterísticas, conseguir também ir reformulando os produtos. Hoje temos no mercado, em muitas categorias, produtos com menos sal e açúcar.

Através da FIPA, vários setores assumiram, com o Governo, compromissos que estão a ser negociados, no sentido de em alguma categorias poder dar mais visibilidade a esse trabalho, que tem exigido um grande investimento por parte das empresas.

Estas novas tendências são uma oportunidade de negócio para o setor?

Onde estão as tendências aparecem negócios, por norma. Se hoje o consumidor se preocupa com a forma como a alimentação impacta na sua saúde ou no ambiente, as empresas adaptam-se e novos negócios surgem. O consumidor hoje acaba por ser o grande motor desta indústria.

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Qual o impacto que o ‘boom’ que tivemos no digital e no e-commerce, e que seguramente se irá manter em parte, poderá ter na indústria alimentar?

O e-commerce era algo que não estava muito enraizado na área alimentar e, certamente as pessoas vão continuar a ir às lojas para ver e escolher os produtos, mas ainda não sabemos em que medida esta tendência se vai manter, nomeadamente nas novas gerações. Mas, de facto acelerou um pouco ao nível do abastecimento alimentar e curiosamente também no comércio local, que começou a fazer entregas, e na restauração (através dos vários serviços de entrega).

Esta tendência vai exigir trabalho do setor ao nível da inovação, nomeadamente, na forma como se disponibilizam os alimentos, para que cheguem nas melhores condições.

O digital em sentido mais lato tem tido grande impacto na indústria, ao nível da gestão da produção e da logística, por exemplo, e vai continuar a ter. Não podemos esquecer também o impacto ao nível do trabalho, com o teletrabalho, com desafios muito grandes para pôr as equipas a trabalhar e de manter as dinâmicas. E no futuro, os modelos de trabalho irão passar, em alguns casos, por modelos mistos.

Em termos de inovação, quais considera que serão as áreas-chave para o setor no futuro?

A área das embalagens é muito promissora ao nível da inovação, também a digitalização irá fazer o seu caminho e com impacto grande nas empresas, igualmente a nível de formulação de ingredientes vamos ter uma progressão baseada na investigação do impacto de cada ingrediente do ponto de vista nutricional, porque são áreas onde existe pressão do mercado e vontade das empresas.

Se hoje o consumidor se preocupa com a forma como a alimentação impacta na sua saúde ou no ambiente, as empresas adaptam-se e novos negócios surgem. O consumidor hoje acaba por ser o grande motor desta indústria.

Ao nível das exportações, a Europa continua a ser o nosso grande mercado. Há uma aposta na diversificação dos mercados?

Temos, de facto, uma grande dependência do mercado europeu e há uma grande oportunidade para se começar a diversificar para países terceiros. Mas atenção que exportar não implica apenas enviar um produto para outro país. Exportar implica, muitas vezes, adequar os produtos às questões sensoriais, culturais, etc. e é preciso conhecer isso muito bem. Porque entrar num mercado sem conhecer tudo isso, por vezes, acaba por inviabilizar o sucesso.

Ao nível da promoção dos produtos o digital também veio trazer grandes mudanças que, algumas, se irão certamente manter…

Sim. Obviamente que as grandes feiras são sempre bem-vindas mas digitalmente é possível chegar a mercados mais distantes e fazer ações mais curtas e mais dirigidas a mercados específicos, por exemplo. A nível da promoção externa o digital também passa a ter um papel diferente.

A FIPA

A Federação das Indústrias Portuguesas Agroalimentares (FIPA) foi constituída em 1987, reúne um vasto conjunto de associações e empresas da indústria agroalimentar que operam em Portugal e tem trabalhado na representação, defesa e dinamização do setor tanto a nível nacional como europeu, junto de decisores políticos, parceiros e sociedade civil.

A estratégia da FIPA centra-se no grande objetivo de projetar o empenho da indústria agroalimentar na disponibilização de produtos cada vez mais nutritivos, seguros, sustentáveis e acessíveis aos consumidores. Desta forma, a sua atuação tem por base um conjunto de pilares e prioridades estratégicas.

Pilares Estratégicos

Consumidor | Promover sinergias entre a indústria agroalimentar e os decisores políticos, parceiros e sociedade em geral, com vista à promoção de escolhas informadas e estilos de vida saudáveis.

Competitividade | Promover um compromisso nacional para a indústria agroalimentar que permita reforçar a competitividade, alavancar o crescimento externo, fomentar o emprego e assegurar a confiança dos consumidores.

Inovação | Defender a criação de condições que permitam intensificar a aposta em investigação, desenvolvimento e inovação já levadas a cabo pela indústria agroalimentar e defender, igualmente, um enquadramento legal que tenha por base comprovadas evidências científicas.

Sustentabilidade | Mobilizar toda a envolvente para uma abordagem sensata à relação única que a indústria agroalimentar tem com todos os intervenientes da cadeia de valor, garantindo o equilíbrio entre a preservação dos recursos e a competitividade a longo-prazo, numa perspetiva económica, social e ambiental.

Prioridades Estratégicas

1. Promoção de hábitos alimentares saudáveis;

2. Equilíbrio na relação entre fornecedores e distribuidores;

3. Suporte à exportação e internacionalização;

4. Adequação da política fiscal à competitividade;

5. Estratégia pública de incentivos à inovação;

6. Transição para a economia circular.

Recorde-se que a revista iALIMENTAR é parceria media partner da FIPA.

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