28 DOSSIER PROTEÍNAS ALTERNATIVAS E O FUTURO DA ALIMENTAÇÃO recurso ao marketing pelas empresas que produzem produtos alimentares com este ingrediente. “É importante que a imagem transmitida do consumo de insetos não seja através do consumo de insetos vivos, pois não é esse o modo de apresentação deste ingrediente, que não passa de uma farinha proteica com um aspeto e textura tão comum como outras farinhas.” Considerando que as faixas etárias mais jovens estão mais propensas a consumir este tipo de produtos, o responsável defende as provas sensoriais às cegas e os testes de mercado. “Quando se vê o valor que o produto apresenta para as formulações, para a saúde ou para a culinária, o fator inseto deixará, com o tempo, de ser uma barreira psicológica. Mas é um trabalho que tem sido realizado pelas empresas”, sublinha. Esta barreira psicológica é mais frequente nos países ocidentais, defende Filipa Sacadura. “No entanto, é importante desmistificar esta questão porque não é expectável que as pessoas consumam insetos ‘inteiros’. O que se pretende é obter farinhas de inseto, ricas em proteínas e de alto valor nutricional, que possam ser incorporados em quantidades baixas a produtos como pão, massas, barras proteicas, etc., para aumentar o seu valor nutricional”, refere. O fator decisivo para a aceitação do público, defende, é a transparência e a comunicação clara dos benefícios nutricionais e ambientais. “É essencial garantir uma rotulagem detalhada, especialmente devido ao potencial de reações alérgicas, nomeadamente em pessoas alérgicas a crustáceos e ácaros.” À medida que os consumidores compreendam os benefícios e que mais produtos entrem no mercado, a aceitação “deverá crescer gradualmente”. REGULAMENTAR, GANHAR ESCALA E INVESTIR Existem outros desafios a enfrentar, desde logo a regulamentação, o financiamento e o conhecimento. José Gonçalves explica: “A regulamentação, porque a introdução de novos alimentos no mercado da União Europeia obriga a um processo que, num cenário muito otimista, demora dois anos. Por outro lado, as aplicações que já passaram por esse processo são somente o começo do que antevemos que seja o futuro.” Quanto ao financiamento, “a maioria do capital de risco está menos disponível para financiar biotecnologia e indústria alimentar do que software, IA e as tecnológicas, em geral”. Existe também uma grande necessidade de conhecimento científico para otimizar processos e garantir produtos que vão ao encontro das necessidades de mercado, o que se reflete na captação de quadros que têm de ser formados internamente. “Não existem ainda recursos académicos que gerem profissionais para o setor. Felizmente, temos múltiplas parcerias com a academia, que já começaram a dar frutos e darão muitos mais no futuro”, afirma. Simão Lima destaca a necessidade – já identificada – de ampliar a escala para validar produtos no mercado, o que se afigura na exigência de enfrentar o desconhecimento geral por parte dos diferentes stakeholders deste setor emergente. “O principal desafio é converter projetos de investigação e de pequena escala em iniciativas capazes de responder às exigências do mercado. Só dessa forma será possível alcançar os grandes players da indústria alimentar e deixar de ser um segmento de nicho.” Também a sustentabilidade financeira é um fator crucial “pois é necessário comprovar a previsão das tecnologias antes da comercialização do produto”. O que é demonstrado em estudos científicos em pequena escala “pode não ter os mesmos resultados quando aplicado em equipamentos industriais. Para atingir os padrões de referência, é fundamental melhorar todas as configurações de produção e manter um controlo rigoroso sobre cada variável”. E, claro está, esse processo exige um investimento significativo de tempo e recursos financeiros. EQUIPAS MULTIDISCIPLINARES Outra questão relevante é a necessidade de ter equipas multidisciplinares. “Este setor abrange áreas tão específicas como a produção animal, a alimentação e os fertilizantes, tornando difícil para startups adquirir conhecimentos complementares com equipas reduzidas”, refere o responsável da Thunder Foods. Do outro lado, surge a pressão dos retalhistas e a cadeia de valor para obter certificações, mesmo quando o produto ainda está em fase inicial de desenvolvimento. Os benefícios e oportunidades das soluções biotecnológicas são evidentes, mas também Filipa Sacadura refere os desafios a superar, desde logo a regulação e aprovação legal. “Muitos produtos inovadores necessitam de aprovação rigorosa antes de chegarem ao mercado, o que pode ser um processo longo e complexo”. Por outro lado, há que ter em consideração os custos de produção, uma vez que “algumas destas tecnologias ainda apresentam custos elevados, o que pode dificultar a sua competitividade em relação aos produtos tradicionais”. Larvas desidratadas moídas
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