27 DOSSIER PROTEÍNAS ALTERNATIVAS E O FUTURO DA ALIMENTAÇÃO consumidor aumente”. O consumo de insetos já é uma realidade, especialmente na Ásia, África e América Latina, onde fazem parte da cultura alimentar há séculos. “A Europa é um mercado emergente, com produtos já disponíveis, principalmente na forma de farinhas e snacks, em países como França, Bélgica ou Países Baixos.” A carne cultivada (agricultura celular) ainda não está autorizada na União Europeia, mas já foi autorizada para consumo humano em Singapura, desde 2020, e nos EUA, desde 2023, contextualiza Filipa Sacadura. Estamos a viver uma fase de mudança de hábitos e estão a surgir outras alternativas à alimentação convencional nacional e europeia. “Os insetos para alimentação já são o presente, apesar de ainda serem um nicho de mercado. Já existem produtos à base de insetos há alguns anos em hipermercados portugueses e em canais de e-commerce”, explica Simão Lima, diretor de qualidade e gestão operacional na Thunder Foods, empresa portuguesa de biotecnologia que produz o Tenebrio molitor (comummente chamado de larva da farinha). “Este foi o primeiro a ser aprovado para a alimentação humana na Europa e tem um conjunto de propriedades que o torna muito interessante para o mercado.” A empresa faz todo o processo de produção animal até ao processamento alimentar e obtenção de dois produtos finais deste processo: um farinado proteico que consiste nas larvas desidratadas e moídas desta espécie – destinado à alimentação humana – e um fertilizante orgânico de inseto (frass) - destinado à nutrição de plantas e dos solos. VENDA DE PRODUTOS À BASE DE INSETOS As vendas relacionadas com a alimentação à base de insetos têm aumentado na Europa, ao mesmo ritmo que cresce o leque de opções. “Em números, são consumidos em todo o mundo mais de duas mil espécies de insetos, e cerca dois mil milhões de pessoas já provaram, em algum momento.” Na Europa, em 2019, “apenas nove milhões de europeus já tinham provado alguma vez. No entanto, prevê-se que, em 2030, esse número seja de 390 milhões de europeus, um crescimento exponencial e, por isso, julgamos que é apenas uma questão de tempo e de investimento para os insetos entrarem em massa na dieta de quase toda a população”, refere Simão Lima. José Gonçalves, CEO e cofundador da The Cricket Farming Co. (empresa portuguesa dedicada à produção de ingredientes alimentares obtidos a partir de grilos) explica que a utilização de ingredientes a partir de insetos já está a acontecer. “E acontece porque faz sentido racionalmente. O conteúdo nutricional é valioso e a pegada ambiental da sua produção é reduzida.” Quando questionado sobre se existe uma barreira psicológica relacionada com o consumo, é perentório: “Não tencionamos pôr insetos inteiros no prato de ninguém. O que fazemos é um concentrado proteico em pó, que vai ser utilizado como ingrediente, para enriquecimento nutricional de outros alimentos.” Sem querer antecipar o futuro, o responsável refere que a empresa já está a trabalhar para o que se considera “ser a segunda geração de ingredientes baseados em insetos”. PRINCIPAIS BARREIRAS O cenário atual é completamente diferente do vivido há dez anos, quando se começou a falar da possibilidade de utilizar insetos na alimentação humana. “Em 2016, poucos acreditavam que tal ideia ‘saísse da casca’. Hoje, a maioria dos nossos interlocutores entendem esta alternativa, quando os motivos lhes são explicados racionalmente”, afirma. Isto é particularmente válido para as gerações mais novas, quando falamos de consumidores, “mas também para os clientes da indústria, que já perceberam o match entre estes ingredientes e as suas gamas de produtos mais sustentáveis e mais cuidados nutricionalmente”. José Gonçalves dá ainda o exemplo do ceticismo inicial gerado pelo sushi e o caminho de popularização que fez até hoje. “Aquilo que era disruptivo tornou-se absolutamente banal.” Já Simão Lima defende que são necessárias campanhas de desmistificação e de sensibilização, mas também do Simão Lima, diretor de qualidade e gestão operacional na Thunder Foods.
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